Translate this Page




ONLINE
91





Partilhe esta Página

                                            

            

 

 


Pensando um País — [2] Senzalas e Raízes
Pensando um País — [2] Senzalas e Raízes

PENSANDO UM PAÍS – PARTE 2

 

SENZALAS E RAÍZES.

 

A geração modernista tomou seu turno, renovando o debate, em escala inédita.  Não foi apenas o caso de Mário de Andrade, pesquisador da cultura popular, agente político e escritor que formulou ensaios de interpretação do país.  Além dele e mais do que ele, foram cientistas sociais de formação sofisticada, fora do Brasil, os maiores ensaístas.  Gilberto Freyre, com Casa Grande e Senzala (1933), e Sérgio Buarque de Holanda, com Raízes do Brasil (1936), são os dois casos mais salientes: ambos legíveis até agora, mergulharam no passado do país para diagnosticar nosso modo de ser.  As generalizações de um e outro soam agora um tanto forçadas – por exemplo, Freyre querendo que todo o país fosse uma mera ampliação do mundo açucareiro – mas de todo modo envelheceram menos do que a interpretação do comunista de Caio Prado Júnior, para quem o Brasil era apenas a plantation litorânea.

 

O Rio Grande do Sul viu nascer um intelectual de grande alcance na mesma época: era Clodomir Vianna Moog.  Pensador próximo das posições de Freyre, com viés determinista quanto às condições geográficas e climáticas, Moog não deixou de apresentar grande originalidade em ensaios como Bandeirantes e Pioneiros, extensa comparação entre a colonização do Brasil e a dos EUA.

  

Na geração seguinte, o pensamento crítico brasileiro encontrou maturidade em outro patamar, fruto, em grande parte, já da vida universitária moderna, inaugurada nos anos 1930. Tal é o caso de pensadores da USP.  Antonio Candido, com seus estudos sobre o mundo caipira (Parceiros do Rio Bonito, 1946) e sobre o sentido construtivo da literatura no país (Formação da Literatura Brasileira, 1959), e Florestan Fernandes, entre outros menos expressivos, souberam aliar o conhecimento científico moderno com a sensibilidade para as necessidades do país.

 

Nesta mesma geração, que publica basicamente entre o final dos anos 1950 e os anos 1970, vamos encontrar três figuras cuja obra ecoa ainda agora.  Celso Furtado, que se pode ler em suas várias obras, defende uma visão emancipacionista do Brasil, apostando que seria possível internalizar os mecanismos de controle do desenvolvimento.  Darcy Ribeiro, antropólogo e ensaísta, quis ver um horizonte de integração das várias etnias que compõem o Brasil e dos vários países americanos, num otimismo que se completou com sua ação política a favor da cultura e da educação.  O gaúcho Raymundo Faoro arguiu com precisão a perversão do poder no Brasil, mostrando que entre nós quem chega lá não se sente representante de nada a não ser de seus interesses pessoais.

 

Na mesma geração ou logo a seguir, outros nomes despontam.  O geógrafo Milton Santos, que foi capaz de uma obra original no cenário acadêmico ocidental em matéria de pouca força no Brasil.  Roberto Schwarz, originado na Sociologia mas com interesse em Literatura, formulou tese de ampla repercussão crítica, as “ideias fora do lugar”.  Fernando Henrique Cardoso, antes de sua vida política, igualmente teve destaque em sua discussão sobre os limites do desenvolvimento na periferia do sistema capitalista.  (FHC, por sinal, em interessante iniciativa, apresentará uma série no Canal Brasil, em outubro, com 13 episódios que repassarão a vida e a obra de muitos desses pensadores, numa série dirigida por Bruno Barreto e com contribuição de Elio Gaspari.)

 

Fonte:  Jornal ZH/Luís Augusto Fischer (Escritor e professor da UFRGS) em 06/09/2015.