ENTRE O PAPEL E O DIGITAL
MERCADO EDITORIAL / APOSTAS DE ALGUMAS EDITORIAS, E-BOOKS AINDA ENFRENTAM RESISTÊNCIA NO MERCADO.
“As notícias que temos é que o mercado esperava que a coisa fosse muito mais positiva. Está engatinhando, devagar.” Essa é a confirmação de Marco Cena, presidente da Câmara Rio-Grandense do Livro, a respeito da situação do livro digital no estado. “Não é um hábito que se efetivou, digamos”, completa.
Um comparativo de pesquisa Retratos da Leitura no Brasil, promovida pelo Instituto Pró-Livro nos anos de 2011 e de 2015, mostra que o número de pessoas consultadas (5 mil) que já ouviu falar dos e-books aumentou de 30% para 41% neste período. Entre aqueles que já leram em suportes digitais, só 15% afirmam ter pagado pelos downloads.
De acordo com Ivan Pinheiro Machado, da editora L&PM, os e-books representam em torno de 2% do faturamento da empresa – enquanto os livros pocket, por exemplo, ficam entre os 55% e 60%. A L&PM é uma das sete sócias da DLD (Distribuidora de Livros Digitais), que presta serviços para o mercado editorial brasileiro. As previsões iniciais do conglomerado eram de um otimismo que não se confirmou. “Criamos a DLD em 2009 e imaginávamos que, em 5 anos, teríamos de 8% a 10% do faturamento em livros digitais”, expõe ele. “A cultura do livro é muito profunda. A bíblia de Gutemberg é do século XV. Qual o produto hoje que é igual ao de 500 anos atrás?”, indaga.
Rodrigo Rosp, da Dublinense, também trabalha com este formato desde que o assunto começou a ficar quente, na virada da década. Ele ratifica que a venda dos e-books é quase insignificante, embora não saiba precisar todos os fatores por trás desta realidade. “Talvez no Brasil não tenha funcionado tão bem porque o hábito de leitura não é tão forte quanto nos Estados Unidos ou Europa, onde vale a pena ter um dispositivo só para livros”, especula ele, em referência a aparelhos como o Kindle.
Conforme Rosp, outro elemento que integra esse panorama é a própria disposição das editoras. “Em 90% das vezes, o valor do e-book é meio proibitivo. Parece que ele oi visto mais como ameaça do que como oportunidade”, opina. No mesmo sentido, o consultor editorial Paulo Tedesco vê a relação do mercado com o produto digital com ressalvas. “Eles acham que estão perdendo tempo e dinheiro, mas no fundo têm insegurança”, resume.
Para Machado, não há “Grenal” entre os tipos de livros. O modelo de e-book, inclusive, seria ideal – por reduzir custos em papel e logística. Por outro lado, ele acredita que esse formato não seja algo em que se empregue uma energia absurda. “[A DLD} foi uma atitude de defesa nossa, e adotamos estratégias de marketing que o mercado oferece. Não forçamos a barra. Nosso negócio é vender o livro para a livraria, porque isso representa 98% do nosso faturamento”, destaca.
OUTROS CAMINHOS
De acordo com o consultor editorial Paulo Tedesco, a grande jogada do e-book não é a venda – que compete com o livro tradicional –, e sim um modelo de biblioteca digital. “Isso vai impor uma lógica diferente de mercado”, aponta ele.
A ideia, presente em iniciativas como a Nuvem de Livros, também recebe elogios de Rodrigo Rosp, da Dublinense. “A venda pontual de e-books é ínfima, mas vejo um espaço tremendo no mercado em um esquema de ‘Netflix de e-books’. Isso nos representa um faturamento legal.”
Os dois se referem a iniciativas que disponibilizaram uma série de títulos para assinantes e distribui parte da receita para os títulos que estão no catálogo – e, assim, as editoras repassam os direitos autorais para os autores, de acordo com cada contrato.
Há dois anos no mercado e dedicada a livros digitais, a Elefante Letrado encontrou seu nicho com uma visão dentro deste contexto. O trabalho da empresa é direcionado a escolas e oferece a alunos, com acompanhamento dos professores, obras de nomes como Monteiro Lobato e Ziraldo.
“Enquanto tu tens livros digitais ‘soltos’ em uma Amazon, tu pagas e, de repente, não era bem aquele o livro indicado para a criança”, compara Simone Sudbrack, gestora de suporte da editora. “Aqui, tu tens um ambiente em que a professora verificou o nível do livro na biblioteca e vai fazendo um trabalho adequado com a criança. A escola dá continuidade”, exemplifica.
Fonte: Jornal do Comércio/Caderno Panorama/Ricardo Gruner em 31 de maio de 2016.