VENTURAS E DESVENTURAS DOS SOVIÉTICOS
Diz a piada – ou história verdadeira – que o premiê russo Leonid Brejnev convidou a mãe, camponesa, para visitá-lo em Moscou. Mostrou os palácios, seu apartamento, casa de campo e o carrão. Ela, quieta, no domingo pediu para voltar, de trem, para alimentar as galinhas do sítio. Brejnev perguntou: “Mãe, o que achou de tudo?”, e ela: “Querido, sempre soube da tua capacidade, não imaginei que fosses tão longe, parabéns. Mas não tens medo que venha o comunismo e te tire tudo isso?”.
OS PARADOXOS DA REVOLUÇÃO RUSSA (Alta Books, 156 páginas), de Paulo Fagundes Visentini, consagrado historiador e professor-doutor em História pela USP, com pós na London School of Economics, mostra a ascensão e queda do socialismo soviético (1917-1991) e traz novas teses sobre o stalinismo, as guerras e a queda da URSS. Visentini é titular em Relações Internacionais da UFRGS, escreveu vários livros sobre História Mundial Contemporânea e, no ano em que se registra a passagem dos 100 anos da Revolução de 1917, traz novas luzes sobre a mais impactante revolução do século XX.
Com erudição, profundidade, equilíbrio e linguagem acessível, o autor não analisa a revolução como boa ou má, como vencedora ou perdedora, de modo simplório ou maniqueísta. Nos mostra os ganhos e as perdas, as venturas e desventuras da experiência soviética e como até agora influencia o mundo. Uns dizem que as ideias socialistas não deram certo em país nenhum, outros apontam que o socialismo sobrevive de forma adaptada ao capitalismo. O tema é complexo, pede análises mais profundas, como pretende Visentini, que se ocupou, de modo científico, a examinar os grandes paradoxos da revolução russa.
No final, diz o autor: “Ainda hoje, um século depois da Revolução Bolchevique e 25 anos depois da dissolução da URSS e do fim do socialismo soviético, carecemos de conhecimento básico e de análises históricas mais objetivas. O silêncio e a manipulação prejudicam a compreensão da história mundial e do estabelecimento de uma identidade dentro da nova Rússia. Não se pode simplesmente apagar um longo período histórico nem deixar de buscar sua compreensão. E o fato de haver sido derrotada, não diminui seu enorme impacto histórico e político mundial, que já foi julgado por muitos e compreendido por poucos, em todos os seus paradoxos”.
A mãe de Brejnev morreu preocupada. O guri se foi antes da queda, em 1982 deixando alguns anos dourados como lembrança.
Fonte: Jornal do Comércio/Livros/JaimeCimenti (jcimenti@terra.com.br) em 08/10/2017.