ÍNTIMO E REVELADOR
Nova edição resgata os diários da escritora Syvia Plath.
Dos 11 anos até a sua morte, aos 30, a escritora norte-americana Sylvia Plath (1921–1963) registrou suas experiências e angústias em diários e memórias. Parte desses registros vem à tona com uma nova e mais completa publicação de OS DIÁRIOS DE SYLVIA PLATH: 1950-1962 (Biblioteca Azul), os quais cobrem seus anos de faculdade, seu casamento com o poeta Ted Hughes, além de sua vida profissional, etc.
Organizada pela curadora de coleções especiais do Smith College, Karen V. Kukil, a edição deixa de fora os diários redigidos três anos antes de a escritora se suicidar; um dos diários desapareceu, segundo Hughes, e outro foi destruído por ele.
Nos seus cadernos, Sylvia, uma das mais célebres escritoras do século XX, se revela desde cedo, uma pessoa extremamente melancólica. Ela já afirmava, antes dos 20 anos: “Talvez eu não seja feliz, mas esta noite estou contente”.
Nos primeiros anos de faculdade, no Smith College, ela escreve sobre seus desejos sexuais, inseguranças e sobre a vontade de “romper com os costumes sem efeitos desastrosos”: “consigo apenas […] odiar os rapazes que podem esbanjar livremente o apetite sexual, sem receio, permanecendo íntegros, enquanto eu me arrasto de encontro em encontro ensopada de desejo, sempre insatisfeita”.
Nos anos 1950, na conservadora sociedade em que vivia, Sylvia declara sofrer as penas das mulheres instruídas e emancipadas: “sou crítica, exigente, aristocrática no gosto”. Mas, ainda assim, não descartava a estabilidade de uma vida convencional, do casamento, ainda que temesse que ele tomasse seu “desejo de expressão”, ou que “a aura sensual do casamento suprima o desejo de escrever”.
Aos 20 anos, a escritora admite ter chegado próximo ao suicídio: “Meu Deus, se em algum momento cheguei perto de querer cometer suicídio foi agora […] Aniquilar o mundo pela aniquilação de si mesmo é o auge do egoísmo desesperado”. Sylvia sentia-se cansada e banal, queria dedicar-se a muitas tarefas, mas parecia, segundo ela, falhar em todas. Temia, antes de mais nada, “a morte da imaginação”. No ano seguinte, tentou suicidar-se tomando uma overdose de soníferos.
O leitor vê, em seu diário, como ela conheceu Ted Hughes: um “rapaz enorme, moreno, robusto, o único ali enorme o bastante para mim, que circulava mexendo com as mulheres”. Os primeiros anos de casamento com Hughes, em Londres, e a ida deles à Espanha são extremamente tranquilos. Nos relatos, ela não parece a pessoa atordoada dos tempos do Smith College. Nessa época, continuava buscado um estilo para a sua escrita, estilo esse que Hughes parecia já ter encontrado.
De volta aos Estados Unidos, torna-se obcecada com a ideia de estar produzindo uma obra menor que a do marido. Conjecturava que só teria casado com Hughes porque ele sabia “que era um poeta melhor do que eu, e que jamais precisaria reprimir meu pequeno dom, que poderia estimulá-lo e me dedicar ao máximo, sempre sabendo que ele estava à frete”. Apesar disso, afirmava viverem uma união “perfeita”, pois a vocação de ambos era escrever e o amor entre eles era mútuo, ainda que sentisse ciúmes dele.
Em seus escritos, a poeta revela, ainda, o ódio que sentia pela mãe, a quem culpava por ter matado seu pai, “primeiro aliado masculino no mundo”; e expõe o medo de ser estéril, embora não acreditasse que os filhos pudessem humanizá-la ou torná-la melhor. Nas 840 páginas da publicação, vemos uma escritora despida por inteiro, com seus medos e anseios. Pena que partiu cedo demais.
Fonte: Jornal do Comércio/Caderno Panorama em 07/02/2018.