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A Periodização Literária no Brasil
A Periodização Literária no Brasil

 

A Periodização Literária e História da Literatura Brasileira 1500 até início do romantismo.

 

A primeira referência à literatura brasileira registra-se no ensaio “Bosquejo da história da poesia e língua portuguesa”, como introdução da antologia Parnaso Brasileiro, de Almeida Garret (1799-1854), publicada em 1826.  Embora a Independência do Brasil já houvesse sido declarada desde 1822, a Literatura Brasileira ainda era entendida como um apêndice da literatura da metrópole, Portugal.

 

A Independência teria sido fator determinante para o surgimento da literatura brasileira? Em que medida os fatos políticos e econômicos afetam a produção artística de uma nação?

 

A tendência  primeira, ao se estudar o conjunto de obras de um determinado país, manifesta-se pela associação da história da literatura à história dos acontecimentos, como se os fatos fossem determinantes para as manifestações literárias. Deve-se deixar bastante claro que o estudo da literatura não é um apêndice da história.

 

“Com ser de natureza estética, o fato literário é histórico, isto é, acontece num tempo e num espaço determinados. Há nele elementos históricos que o envolvem como uma capa e o articulam com a civilização –personalidade do autor, língua, raça, meio geográfico e social, momento; e elementos estéticos, que constituem o seu núcleo, imprimindo-lhe ao mesmo tempo características peculiares, que o fazem distinto de outro fato da vida (econômico, político, moral, religioso): tipo de narrativa, enredo, motivos, ponto de vista, personagens, linha melódica, movimento, temática, prosódia, estilo, ritmo, métrica, etc., diferindo conforme o gênero literário e, ao mesmo tempo, contribuindo para diferenciá-lo” (COUTINHO, 2004, p. 9).

 

COUTINHO, Afrânio. A Literatura no Brasil. 7.ed. São Paulo: Global, 2004. vol. 1. p. 9)

 

O método adotado para o estudo das obras é fundado em um sistema que não se propõe a abolir os referenciais cronológicos, mas que considera como indicador de compilação, segundo René Wellek, o período como unidade de análise.

 

Dessa forma, o período literário possui uma natureza que é cronológica, mas orientada pelo predomínio de valores estéticos específicos em determinada época e, por essa razão, não é adequado que demarquemos datas balizadoras para seu início ou fim, pois os períodos se interpenetram, algumas vezes dialogam ou se contrapõem.

 

Como dissemos, o sistema periodológico é um dos vários métodos possíveis, e não é raro que seja contestado também.

 

Hans Robert Jauss, em uma conferência apresentada na Universidade de Constança, em 1967, chamava a atenção para outros aspectos que devem ser considerados quando do estudo da história da Literatura e segundo ele: “A história da literatura é um processo de recepção e produção estética que se realiza na atualização dos textos literários por parte do leitor que os recebe, do escritor, que se faz novamente produtor, e do crítico, que sobre eles reflete. A soma – crescente a perder de vista – de ‘fatos’ literários conforme os registram as histórias da literatura convencionais é um mero resíduo desse processo, nada mais que passado coletado e classificado, por isso mesmo não constituindo história alguma, mas pseudo-história”

 

Fonte: JAUSS, Hans Robert. A história da literatura como provocação à teoria literária. Trad. Sergio Tellaroli. São Paulo: Ática, 1994. p. 25.

 

Então, onde ficamos?

 

Será o escritor um porta-voz de seu tempo?

 

Representaria ele, por meio de suas obras, a sociedade? Ou a obra deveria ser apenas a expressão do  “espírito do autor”?

 

Segundo Dominique Maingueneau, existem duas atitudes dominantes entre os analistas da Literatura: “a da história literária”, considerando a obra a expressão de seu tempo, e a de “orientação mais estilística”, que prefere apreender a obra como um universo fechado.

 

Por outro lado, não se pode ignorar que o autor manifesta, por meio de seu estilo, a distribuição de papéis dentro de uma sociedade e a ideologia que sustenta a divisão de classes. Tal posicionamento identifica a postura crítica marxista, que deve a Lucien Goldmann, seguidor de G. Lukács, estudos importantes sobre a relação entre a arte e a ideologia.

 

“Qualquer grande obra literária ou artística é a expressão de uma visão do mundo. Esta é um fenômeno de consciência coletiva que atinge o máximo de clareza conceitual ou sensível na consciência do pensador ou do poeta. Os últimos exprimem-no por sua vez na obra estudada pelo historiador, que se serve do instrumento conceitual que é a visão do mundo” (GOLDMANN, L. Lê Dieu cachê. Paris: Gallimard,1964, p. 218-219 apud MAINGUENEAU, D. p.8).

 

A aproximação de posturas entre a crítica marxista e a crítica filológica é patente, uma vez que, de certa maneira, a obra de arte seria considerada como um reflexo de uma “visão de mundo”. Assim, a história seria determinante de uma determinada forma de expressão em uma determinada época.

 

Um expediente muito eficiente quando estudamos a arte de um determinado período é a comparação. É por meio dela que se observam as convergências ou divergências entre a Literatura e as outras artes em uma determinada época. Esses estudos configuram a Literatura Comparada, uma disciplina que se propõe a estabelecer e analisar esses confrontos.

 

Vejamos o caso de um estilo de época, o Realismo.

 

Contrapondo-se aos exageros emotivos do Romantismo, o Realismo é um estilo que se manifesta nas produções artísticas a partir de meados do século XIX. Na Literatura, há a predominância da narração em terceira pessoa, a objetividade e a busca pela descrição o mais fiel possível da realidade.

 

“Deu por si na calçada, ao pé da porta: disse ao cocheiro que esperasse, e rápido enfiou pelo corredor, e subiu a escada. A luz era pouca, os degraus comidos dos pés, o corrimão pegajoso; mas ele não viu nem sentiu nada. Trepou e bateu. Não aparecendo ninguém, teve ideia de descer; mas era tarde, a curiosidade fustigava-lhe o sangue, as fontes latejavam-lhe; ele tornou a bater uma, duas, três pancadas. Veio uma mulher, era a cartomante. Camilo disse que ia consultá-la, ela fê-lo entrar.

 

Dali subiram ao sótão, por uma escada ainda pior que a primeira e mais escura. Em cima, havia uma salinha, mal alumiada por uma janela, que dava para o telhado dos fundos. Velhos trastes, paredes sombrias, um ar de pobreza, que antes aumentava do que destruía o prestígio.”

 

 

E NA LITERATURA, QUAIS SERIAM OS TRAÇOS PRINCIPAIS?

Na poesia, o Cubismo é perceptível pela simplicidade, por uma sintaxe orientada pelo sentido e não pela gramática.

 

Cidade

 

Foguetes pipocam o céu quando em quando

Há uma moça magra que entrou no cinema

Vestida pela última fita

Conversas no jardim onde crescem bancos

Sapos

Olha

A iluminação é de hulha branca

Mamães estão chamando

A orquestra rabecoa na mata

Oswald de Andrade

 

Convém mencionar outro conceito literário importante: a Geração.

Geração, segundo Afrânio Coutinho, pode definir-se como “um grupo de escritores de idades aproximadas que, participando das mesmas condições históricas, defrontando-se com os mesmos problemas coletivos, compartilhando de idêntica concepção do homem, da vida e do universo e defendendo valores estéticos afins, assumem lugar de relevo na vida literária de um país mais ou menos na mesma data. Trata-se de um conceito suplementar em nossos estudos da periodicidade literária.

 

No caso específico da Literatura Brasileira, a determinação do ponto de partida do estudo das histórias da literatura é dado como publicação de História da Literatura Brasileira, de Silvio Romero, em 1888. Antes dessa obra houve referências, como já mencionamos, à literatura produzida no Brasil. Entretanto, esta ainda era compreendida como colônia e, por isso, constante do capítulo ultramar da literatura portuguesa.

 

Observa Marisa Lajolo, que as histórias literárias surgem a partir dos processos de afirmação das nacionalidades europeias e não foi diferente com o caso brasileiro. Desde o primeiro momento, existe uma forte aliança entre produção literária e o “projeto de construção nacional”. Os efeitos dessa visão se refletem diretamente sobre a construção do que podemos chamar de cânon da literatura brasileira, que não pode ser compreendido como uma sequência, mas como um sistema: “(...) trata-se de uma sequência cujo estabelecimento passa pela mediação de inúmeras leituras seletivas que, pautando-se por igualmente seletivos protocolos (de leitura literária), foram aprovando certas obras e rejeitando outras, num gigantesco processo de seleção e combinação, cujo o resultado constitui o cânon da literatura brasileira”

 

O ensino da literatura brasileira nas escolas vigora desde os tempos da monarquia, fazendo parte das antologias escolares. Sua importância ultrapassa o mero conhecimento dos bons autores, pois reside principalmente no conhecimento mais profundo de nosso povo, de nossa cultura e de nossa história. O contato com as obras deve sempre ser guiado, merecendo grupos de debate e discussão, para que a apreensão transborde os momentos e venha compor a bagagem do cidadão. A literatura produzida no Brasil, é um patrimônio cultural, manifestação genuína do povo brasileiro. Sua força é sentida além do mundo lusófono, com a potência artística representativa de nossa identidade.

 

Deleite-se agora com trechos de nossa poesia brasileira, para entrar no clima:

 

Canção do exílio

Gonçalves Dias

 

Minha terra tem palmeiras,

Onde canta o Sabiá;

As aves, que aqui gorjeiam,

Não gorjeiam como lá.

 

Nosso céu tem mais estrelas,

Nossas várzeas têm mais flores,

Nossos bosques têm mais vida,

Nossa vida mais amores.

(...)

 

Não permita Deus que eu morra,

Sem que eu volte para lá;

Sem que desfrute os primores

Que não encontro por cá;

Sem qu’inda aviste as palmeiras,

Onde canta o Sabiá.

 

(Coimbra – julho 1843)

 

 

 

O navio negreiro

 

‘Estamos em pleno mar... Dois infinitos

Ali se estreitam num abraço insano,

Azuis, dourados, plácidos, sublimes...

Qual dos dois é o céu? Qual o oceano?...

Castro Alves

 

Língua Portuguesa

 

Amo o teu viço agreste e o teu aroma

De virgens selvas e de oceano largo!

Amo-te, ó rude e doloroso idioma.

Olavo Bilac

 

 

As sem razões do amor

 

Eu te amo porque te amo.

Não precisas ser amante,

e nem sempre sabes sê-lo.

Eu te amo porque te amo.

Amor é estado de graça

e com amor não se paga.

Carlos Drummond de Andrade

 

Reinvenção

 

(...)

Mas a vida, a vida, a vida,

A vida só é possível

Reinventada.

Cecílía Meíreles

 

Extravio

 

Onde começo,

Onde acabo,

Se o que está fora está dentro

Como num círculo cuja

Periferia é o centro?

Ferreira Gullar