CAFÉ: RIQUEZA DO BRASIL EM GRÃOS
Que o café sempre foi importante para economia e a cultura do Brasil não resta dúvida. O País ainda é o maior produtor e exportador mundial do grão – quanto ao consumo, ocupa a segunda posição. Dentro dos lares, o cafezinho é sinônimo de boas-vindas, de aconchego, e há séculos integra o cotidiano das famílias.
Não à toa, para muitos especialistas e amantes do produto, café é um patrimônio do Brasil – ainda mais, um patrimônio que se bebe. Essa relevância perpassa boa parte da história do País, desde à escravidão até os dias atuais. O Museu do Café, em Santos (SP), é um centro de preservação da memória do café no Brasil – o porto da cidade, ainda hoje, é o maior centro exportador de café verde (in natura) do mundo.
O belo edifício em estilo eclético, localizado na zona portuária, foi erguido em 1922 para centralizar as operações comerciais do grão. Era a famosa Bolsa do Café – nos moldes de um a bolsa de valores, vendedores e compradores ocupavam a sala pública, no térreo, para negociar sacas e mais sacas de grão. “A chave para entender a história do café n o Brasil é o Porto de Santos. Tanto que o produto brasileiro, no exterior, era conhecido como Café Santos, porque levava logotipo do porto nos sacos”, explica Marilia Bonas Conte, diretora executiva do museu,
A construção, para a época, demonstrava a opulência da elite cafeeira paulista. A sala dos pregões públicos, majestosa, conta com um conjunto de obras idealizadas e executadas pelo pintor Benedito Calixto: um tríptico com a possível cena de leitura da Vila de Santos por Brás Cubas; a idealização da Vila de Santos em 1822, segundo estudos do artista com base em fotos e documentos; e a situação da cidade em 1922.
O conjunto tem, ainda, um vitral que também estabelece relações com esses três momentos da história do Brasil por meio de signos e símbolos da mitologia brasileira e greco-romana. Esse complexo conjunto de informações junta-se a diversos outros símbolos maçons, como a estrela de seis pontas no piso ou a disposição do cadeiral e das colunas.
A partir do crash da Bolsa de Nova Iorque, em 1929, a crise atingiu duramente o café brasileiro. As negociações no pregão de Santos foram diminuindo aos poucos, até serem completamente encerradas em 1957. No auge das consequências da crise norte-americana, sacas e mais sacas do grão oram destruídas – perdeu-se toneladas do produto com o intuito de segurar os preços. “Entre 1929 e 1931, principalmente, o Brasil queimou muito café porque o excedente de produção comprometia seu valor”, relembra Marília.
Com o fim das operações da bolsa, a ideia de um museu para celebrar o café se materializou em 1998. Espaço não falta: plenamente conservado, o edifício tem 6 mil metros quadrados. Além de exposições permanentes e temporárias, abriga ainda um Centro de Preservação, Pesquisa e Referência (CPPR) sobre o café, um Centro de Preparação do Café (com cursos para baristas, oficinas e palestras), além de uma cafeteria (não poderia faltar) com alguns dos melhores grãos cultivados no Brasil.
DOS ESCRAVOS AOS BARÕES
Marilia Bonas Conte, diretora executiva do Museu do café, destaca que é impossível dissociar a cultura do café da construção social do Brasil ao longo dos últimos séculos. A produção do grão era dominada pelos barões do café, donos de grandes áreas de terras. Os trabalhadores, muitos deles escravos, chegaram ao Brasil justamente com o propósito de serem explorados da cadeia produtiva do café. “Quando falamos na história do café, na sua importância e na sua riqueza, fazemos questão de ressaltar a importância dos escravos”, avisa Marília.
Nas primeiras décadas do século XVIII, o café começa a ser cultivado no Brasil por agricultores paraenses e outros estados do Norte e do nordeste. Por volta de 1760, o café cega ao Rio de Janeiro, onde havia um solo mais fértil.
Nas décadas seguintes, o grão avança para terras paulistas, mineiras e capixabas. Em São Paulo, mais especificamente, o café começa a ser cultivado no Vale do Paraíba a partir de 1790. Viria, mais à frente, um impulso no cultivo, com a utilização de mão de obra escrava. Conforme informações do Museu do Café, no período compreendido entre 1831 e 1855, cerca de 400 mil africanos vieram para o Brasil como escravos. Esses anos ficaram marcados como de grande expansão nas lavouras em São Paulo e no Rio de Janeiro.
Até a abolição da escravatura, em 1889, um grande “tráfico” interno ocorreu no interior do Brasil, com as pessoas sendo levadas de regiões mais pobres e distantes, como o Norte, para trabalharem nas fazendas de café do Sudeste. “Essa história não pode ser esquecida – ela está presente aqui no museu”, explica Marília.
Fonte: Jornal do Comércio/Cristiano Vieira, de Santos (SP) em 28/8/2016.