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Diana Lichtenstein Corso: Nossas Tantas Alices
Diana Lichtenstein Corso: Nossas Tantas Alices

NOSSAS TANTAS ALICES

 

Andam nascendo muitas Alices.  Essa questão de nome de época nos pega sem nenhuma consciência de estarmos participando de um coletivo de repetidores.  Aqui em casa, fizemos isso nas duas gestações, nas quais nos apaixonamos por nomes para nossas filhas que pareciam perfeitos e originais.  Chegada a época de creche ou escola, a maior parte dos pais surpresos descobre-se bem pouco original.

 

Há nomes que evocam um jogador de futebol em alta, um personagem da novela, atriz ou modelo famosa.  Mas os verdadeiros nomes de época não têm origem tão clara, só passam a soar bem e não sabemos por quê.  Porém não creio que em relação à escolha de Alice isso seja tão enigmático.

 

Faz 150 anos que Carrol escreveu uma história que havia contado, durante um passeio, para as filhas de um colega.  Entre elas, estava Alice Liddell, por quem tinha declarada preferência.  Ela gostou tanto daquela trama, na qual a protagonista tinha seu nome, que pediu que a escrevesse para ela.  Convidado a publicá-la, ele acrescentou alguns personagens e cenários, compondo o inesquecível Alice no País das Maravilhas.  Mas o que fez dessa história maluca, cheia de charadas lógicas, criadas por um matemático gago que dava aulas soporíferas, um clássico?  Por que até hoje nascem Alices, francamente inspiradas pela heroína dessa narrativa?

 

Carrol cativou seu público infantil inicial por criar trocadilhos e mal entendidos entre as personagens, que soam parecidos aos pensamentos das crianças.  Além do típico humor inglês, que mistura duras críticas com toques de absurdo e caricatura.  Provavelmente, o sucesso da história foi decorrente da complexidade de linguagem, dos personagens e cenários oníricos e principalmente da irreverência tão diferente dos contos morais e pueris que eram dirigidos às crianças.

 

Carrol inventou a primeira heroína feminista da história da literatura infantil.  É por isso que continuam nascendo tantas Alices.  Ela explorou o País das Maravilhas debatendo, desobedecendo, questionando as figuras importantes do lugar, sendo irônica.  Em nenhum momento, teve medo ou vontade de voltar para casa.  Ao contrário, para viabilizar as aventuras, foi mudando de tamanho sempre que necessário para ir a um novo lugar ou escapar de uma enrascada.

 

Paira uma dúvida sobre a pedofilia do autor, dado aos seu fascínio por meninas a quem inclusive fotografava adormecidas, com as roupas em sugestivo desalinho.  Arisco dizer que Carrol era seu genuíno admirador.  Não importa a identidade de gênero que ele teria assumido ou que teríamos lhe atribuído hoje, talvez gostaria de ter sido uma delas.  O fato é que ele fez da pequena Alice Liddell o protótipo das meninas destemidas que hoje os pais querem colocar no mundo.  E isso há 150 anos!

 

Fonte:  ZH/Diana Lichtenstein Corso/Psicanalista (dianamcorso@gmail.com) em 02/08/2015.