O PIOR DE CADA SIGNO E QUAIS COMBINAM MELHOR NO ZODÍACO
"A Astrologia de Liv Strömquist" é a mais recente história em quadrinhos da autora sueca publicada no Brasil
Qual é a pior característica de cada signo? Por que consultamos diariamente o horóscopo? Quem combina melhor com quem no zodíaco? Por que Beyoncé é "um exemplo óbvio pra caramba" do virginiano chato? O que a sagitariana Taylor Swift pode nos ensinar sobre o amor? Por que todos os famosos "são com certeza leoninos" — e por que "têm cara de leão"? O que Gêmeos tem a ver com as batatas Pringles? "Por que as pessoas, uns trezentos anos depois do Iluminismo, ainda se interessam por astrologia?"
Perguntas assim movem A Astrologia de Liv Strömquist, a quarta história em quadrinhos da autora sueca a ser publicada no Brasil (Quadrinhos na Cia, tradução de Kristin Lie Garrubo, 184 páginas, R$ 99,90).
Ainda que Liv Strömquist volte a citar filósofos e sociólogos, como o alemão Theodor W. Adorno (1903-1969), notório crítico da indústria cultural, ou o grego Aris Komporozos-Athanasiou, esta é sua obra mais zombeteira. Ela define Áries, por exemplo, como o troglodita do zodíaco. As pessoas desse signo são "insanamente teimosas, individualistas e fervorosas", como a primatologista e antropóloga britânica Jane Goodall, que, brinca a quadrinista, depois de mais duas décadas interagindo com macacos na Tanzânia conseguiu somente ser considerada "a pior chimpanzé do bando inteiro".
Cancerianos, por sua vez, são os chorões: continuam ressentidos com aquilo que você disse em 1996 e ficam chateados com o companheiro sem dizer o motivo. Escorpianos são os mais saidinhos: escutam o audiolivro de Cinquenta Tons de Cinza sem fone, te dão uma coleira para comemorar o primeiro mês de namoro e postam fotos como "aquela" de Kendall Jenner — devidamente reproduzida no livro.
É nítido o desejo de Strömquist de provocar mais risos do que epifanias. Vale comparar a simplicidade do título com a extensão e profundidade dos três anteriores, todos publicados no Brasil pela Quadrinhos na Cia: A Origem do Mundo: Uma História Cultural da Vagina ou A Vulva vs. o Patriarcado (lançado no país em 2018), A Rosa Mais Vermelha Desabrocha: O Amor nos Tempos do Capitalismo Tardio ou Por que as Pessoas se Apaixonam tão Raramente Hoje em Dia (2021) e Na Sala dos Espelhos: Autoimagem em Transe ou Beleza e Autenticidade como Mercadoria na Era dos Likes & Outras Encenações do Eu (2023).
E basta citar uma passagem da terceira parte da HQ, em que a própria Liv Strömquist é personagem. Sua mãe, uma bibliotecária que depois de aposentada virou instrutora de ioga, pede que a filha não faça um livro sobre astrologia. Liv protesta, a mãe retruca:
— Nesse caso, você precisa escrever algo positivo sobre cada signo do zodíaco. Ou as pessoas vão ficar tristes.
— Mas, mãe, não tem GRAÇA escrever "algo positivo" sobre cada signo! Meu Deus, a ideia é que o livro seja DIVERTIDO!
Ironicamente, é justamente a partir desse momento que Strömquist passa a falar mais sério, tentando entender a popularidade da astrologia e o respeito a ela na sociedade. Com Adorno a seu lado, a quadrinista aborda o fenômeno "Mercúrio retrógado" para ilustrar um traço marcante a astrologia: "a mistura paradoxal entre a irracionalidade e a racionalidade", ou seja, a distribuição de conselhos práticos, que "beiram a paródia do que é sensato", quando somos vítimas de uma "força cósmica sobrenatural que sabota nossos eletrodomésticos e atrapalha as relações".
Adorno, que estudou uma coluna de horóscopo do jornal Los Angeles Times entre novembro de 1952 e fevereiro de 1953 e analisou o conteúdo no texto intitulado As Estrelas Descem à Terra (publicado no Brasil em 2007 pela Editora Unesp), fornece a base teórica para Strömquist explicar por que buscamos e acreditamos na astrologia.
Ela dá cinco motivos: a astrologia pode funcionar como uma defesa narcisista; reflete uma tendência que já existe na sociedade ("Todos temos a sensação de ser controlados por uma lei cósmica completamente inacessível, caprichosa e ininfluenciável a que resta apenas nos conformar", escreve a autora); em uma era de extremo narcisismo, oferece mais uma chance de ficar obcecado com o próprio umbigo; suas respostas aleatórias, caóticas e "mentirosas" são a única coisa que parece convincente numa época de incerteza radical; e a astrologia pode funcionar como um veículo para a ansiedade generalizada — seguir as recomendações de um horóscopo ou se adaptar aos signos do zodíaco em sua vida profissional pode dar uma espécie de alívio temporário e ilusão de controle.
Sobre esse último item, Strömquist e Adorno advertem: a astrologia é remédio e doença ao mesmo tempo. Em um dia, pode dar a sensação de que você está no caminho certo; no outro, sugerir que algo ruim vai acontecer. Se você acredita no horóscopo, talvez seja prudente escolher QUANDO acreditar.
Fonte: Zero Hora/Ticiano Osório em 25/09/2025