
ENQUANTO VOCÊ DORMIA, O MUNDO MUDOU
Mais do que aprender a usar IA, precisamos aprender a pensar com IA
Enquanto o mundo dormia, em 30 de novembro de 2022, uma tecnologia saiu do laboratório e entrou no cotidiano: o ChatGPT. O que parecia curiosidade de geek virou, em dois anos, o novo idioma da produtividade, da educação e dos negócios. Desde então, o ritmo das transformações é tão vertiginoso que quem não aprender a “falar IA” corre o risco de se tornar o analfabeto funcional do século 21.
A inteligência artificial deixou de ser uma ferramenta de especialistas e virou infraestrutura invisível. Ela já orienta como pedimos comida, tomamos decisões, fazemos marketing e ensinamos crianças. Está embutida em aplicativos, serviços e rotinas. Por isso, exige um novo tipo de alfabetização – não mais apenas digital, mas algorítmica.
Saber usar IA não é apertar botões. É entender o que ela faz, por que responde de determinado modo e como influencia nossas escolhas. É o mesmo salto que a sociedade deu quando percebeu que “saber ler” não bastava. Era preciso interpretar. Agora, interpretar envolve também entender como os sistemas aprendem, quais dados consomem e que vieses carregam.
Na abertura do AI Festival, o CEO da StartSe, Júnior Borneli, resumiu o espírito do tempo com uma frase: “Enquanto você dormia, o mundo mudou.” Ele se referia ao lançamento do ChatGPT, que, na madrugada de 30 de novembro de 2022, virou a página da história tecnológica diante de nossos olhos. Desde então, dormimos em um mundo e acordamos em outro – e essa tem sido a rotina de quem tenta acompanhar o ritmo da inovação.
Borneli lembrou que vivemos “no gerúndio”: aprendendo, testando, conhecendo. Mais do que uma metáfora, é uma condição de sobrevivência profissional e intelectual.
Durante décadas, o currículo exibia com orgulho “Excel avançado”. Agora, o diferencial é entender prompt, modelo, RAG e contexto. Aquilo que parecia detalhe de TI virou gramática de qualquer carreira. Assim como o inglês foi o idioma da globalização, o básico de IA será o idioma da economia digital.
Empresas como Amazon e Microsoft já investem, desde 2019, em programas de letramento em IA. No Brasil, o tema ainda soa como modismo corporativo, não como política pública de educação básica. Se o país quiser disputar relevância global, precisa colocar essa nova alfabetização no mesmo patamar da leitura, da matemática e do pensamento crítico.
Quem nasceu antes de 2022 é um imigrante de IA. Está tateando, aprendendo, testando. Isso não é desvantagem. Como lembra Cristiano Kruel, também da StartSe, “os coroas estão de volta ao jogo”. Repertório humano, experiência e leitura de contexto valem muito. Ainda assim, não há espaço para negar o idioma — só para aprendê-lo.
Em poucos anos, veremos os primeiros nativos de IA: jovens que cresceram conversando com algoritmos e resolvendo problemas com modelos generativos. Até lá, todos nós teremos de assumir o papel de aprendizes permanentes.
Ser letrado em IA não é ser programador. É saber o suficiente para participar da conversa — como consumidor, profissional e cidadão. É reconhecer quando confiar, quando duvidar e quando corrigir. É entender que não existe negócio sem tecnologia, nem tecnologia sem propósito.
O futuro já sussurra faz tempo: software virou sinônimo de inteligência. Se ontem o software era o novo petróleo, hoje IA é o novo software – o código que reescreve o mundo. Por isso, mais do que aprender a usar IA, precisamos aprender a pensar com IA.
Esse é o letramento universal que definirá quem permanece relevante – e quem se torna espectador do próprio tempo.
Fonte: Zero Hora/Rafael Martins em 15/10/2025