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Nelhores Livros de 2025 segundo os Críticos abaixo
Nelhores Livros de 2025 segundo os Críticos abaixo

CONHEÇA OS MELHORES LIVROS DE 2025, SEGUNDO CRÍTICOS CONVIDADOS PELA FOLHA

Lista tem 40 lançamentos divididos em ficção e não ficção

Destaques incluem romances, poemas, ensaios e crônicas

 

 

Folha reuniu profissionais que participaram de sua cobertura literária neste ano para selecionar alguns dos melhores livros que leram em 2025.

 

Cada pessoa foi convidada a indicar cinco títulos, divididos nas seções de ficção e não ficção, sem maiores restrições.

 

O resultado são 40 obras que formam um panorama diverso de leituras, dialogando com temas que atravessam a atualidade e refletindo o trabalho de diversos autores e editoras.

 

Parte das obras ainda não chegou às livrarias brasileiras e, nesses casos, foi discriminado o preço de capa na editora original.

 

Confira, a seguir, as recomendações dos jornalistas e críticos convidados pela Folha:

Veja as indicações de cada convidado

Jornalistas e críticos indicam os melhores livros de 2025

Reinaldo José Lopes

Patrícia Campos Mello

Gabriel Trigueiro

Walter Porto

Anna Virginia Balloussier

Ligia Gonçalves Diniz

Luiz Maurício Azevedo

 

NÃO FICÇÃO

 

— REINALDO JOSÉ LOPES

Repórter de ciência e colunista da Folha, autor de '1499: O Brasil Antes de Cabral'

 

'Análise'
Vera Iaconelli, ed.: Zahar, R$ 69,90 (208 págs.), R$ 29,90 (ebook)

Nem o inimigo mais renhido das extravagâncias interpretativas da psicanálise é capaz de ficar indiferente à prosa da autora. Pode ser que as relações que a psicanalista tenta traçar entre sua história pessoal e o pensamento de sua área de trabalho sejam o calcanhar de Aquiles da obra. Ainda assim, a profundidade de introspecção que ela traz para seu autorretrato faz valer cada página.

 

'Determinados'
Robert M. Sapolsky, ed.: Companhia das Letras, trad.: Berilo Vargas, R$ 119,90 (544 págs.), R$ 49,90 (ebook)

Os que esperam um tom mais sisudo num livro que se propõe a responder de uma vez por todas, com base em dados científicos, a velha questão sobre a existência ou inexistência do livre-arbítrio provavelmente vão se irritar com a irreverência autodepreciativa do neurocientista e primatólogo. Por trás das piadas, porém, temos uma cabeça intelectualmente rigorosa, iconoclasta e compassiva. Não é preciso concordar com a tese central do livro para apreciá-la.

 

'Para Entender (Quase) Tudo Sobre o Clima'
Anne Brès, Thomas Wagner/BonPote, Claire Marc (org.), ed.: Edições Sesc, trad.: Andréia Manfrin Alves, R$ 60 (136 págs.)

É impressionante como algo conceitualmente tão simples —uma coletânea de infográficos originalmente publicados numa rede social, produzidos pela colaboração de duas pesquisadoras e um influenciador— consegue resumir tanto do que sabemos sobre a atual emergência climática, com pouco texto e muita informação. Os autores decidiram também, acertadamente, usar o formato "perguntas e respostas" e abordar as primeiras teorias da conspiração sobre o tema. Presente ideal para tios negacionistas.

 

'Proto'
Laura Spinney, ed.: Bloomsbury Publishing, U$ 29,99 (352 págs.), U$ 20,99 (ebook)

A família linguística indo-europeia —a mesma que abrange tanto o português quanto o armênio, tanto o alemão quanto o persa e o hindi— é de longe a mais estudada pelos pesquisadores que buscam reconstruir a evolução dos idiomas, mas ainda há muito a se aprender sobre suas origens. O livro faz uma síntese soberba dos dados mais confiáveis sobre essa história e apresenta uma reconstrução muito mais nuançada da expansão indo-europeia, deixando de lado estereótipos belicistas em voga no século 19.

 

'O que os Psiquiatras Não te Contam'
Juliana Belo Diniz, ed.: Fósforo, R$ 89,90 (256 págs.), R$ 62,90 (ebook)

A essa altura, quase todo mundo deve ter percebido que o tremendo avanço do conhecimento sobre a estrutura e o funcionamento do cérebro não tem sido suficiente para enfrentar a atual pandemia de transtornos mentais. O livro de Diniz mostra por que medicamentos, por mais úteis que sejam, não são balas de prata contra a depressão, a ansiedade e outros males, e como aspectos que vão além dos neurotransmissores ainda são cruciais para a saúde mental.

 

— PATRÍCIA CAMPOS MELLO

Jornalista vencedora do prêmio Maria Moors Cabot e autora de 'A Máquina do Ódio'

 

 

'Empire of AI'
Karen Hao, ed.: Penguin Press, U$ 32 (496 págs.), U$ 16,99 (ebook)

O livro de Karen Hao, que sairá no Brasil pela Rocco em 2026, é essencial para desmistificar a inteligência artificial, que está longe de ser a panaceia alardeada por barões da tecnologia. Por trás do fascinante avanço tecnológico e das promessas de prosperidade futura, estão danos bem concretos ao mundo de hoje. Como mostra Hao, as empresas de IA são como os "impérios da época do colonialismo europeu" que "extraem recursos preciosos para alimentar sua visão da inteligência artificial".

 

'Enshittification: Why Everything Suddenly Got Worse and What to Do About It'
Cory Doctorow, ed.: Farrar, Straus and Giroux, U$ 20 (352 págs.), U$ 15,99 (ebook)

Não, não é impressão sua. A internet está realmente ficando pior. E o autor canadense, um dos mais respeitados especialistas em tecnologia, mostra o porquê em seu livro, de nome traduzível como "merdificação: por que tudo piorou de repente e o que fazer a respeito". O termo popularizado pelo autor descreve a piora gradual nos serviços prestados pelas plataformas de internet à medida que as empresas se tornam mais poderosas. Ele explica o que possibilita essa "merdificação", quais suas consequências e como podemos combatê-la.

 

'1.461 Dias na Trincheira'
Eduardo Scolese, ed.: Autêntica, R$ 79,80 (256 págs.), R$ 55,90 (ebook)

Ao retratar o dia a dia da Redação da Folha durante as coberturas da pandemia de Covid e do governo Bolsonaro, Scolese mostra como os jornalistas encararam um dos trabalhos mais difíceis de suas vidas. Mesmo sob ataque do ex-presidente e enfrentando os perigos do vírus, os jornalistas tentavam trabalhar da melhor maneira possível e buscavam manter o processo jornalístico intacto diante de um governo que ameaçava a democracia. Com riqueza de detalhes e farta documentação, a obra transporta o leitor para a linha de frente da busca da notícia.

 

'Patriota'
Alexei Navalni, ed.: Rocco, trad.: Clóvis Marques, R$ 119,90 (464 págs.), R$ 49,90 (ebook)

Tanto para os aficionados pelo noticiário internacional como para os neófitos em geopolítica, as memórias de Navalni, publicadas postumamente, são uma aula de história recente da Rússia. Apesar de todas as dificuldades que enfrentou, entre elas diversas prisões, o autor consegue manter o bom humor nos relatos do livro. Ao narrar sua "quase morte" em um avião por envenenamento e os meses de solitária a uma temperatura de 35 graus negativos, ele agrega detalhes que ajudam a tornar este livro imperdível.

 

'Ucrânia: Diário de uma Guerra'
Andrei Kurkov, ed.: Carambaia, trad.: Marcia Vinha e Renato Marques, R$ 139,90 (392 págs.), R$ 97,90 (ebook)

Em uma guerra supostamente tecnológica, dominada por drones e robôs, o livro de Kurkov é um banho de realidade ao mostrar como a invasão russa subverteu a vida dos ucranianos. Um dos mais reconhecidos escritores do país, ele consegue nos transportar para o cotidiano dos ucranianos ao mesmo tempo em que analisa a política e a história dos dois países, tudo isso em uma escrita cativante. É um privilégio ter Kurkov como guia para entender como uma guerra desfigura a existência das pessoas tão distantes do front.

 

— GABRIEL TRIGUEIRO

Crítico cultural e doutor em história comparada, é autor de 'Cinéfilo Nem É Gente'

 

'Água Escura: Vozes de Dentro do Véu'
W.E.B. Du Bois, ed.: Fósforo, trad.: Floresta, Nina Rizzi e André Capilé, R$ 104,90 (384 págs.), R$ 73,40 (ebook)

Publicado em 1920, ganhou em 2025 sua primeira edição em português. É complicado não usar o clichê de que é a obra ainda é atual. A força retórica de Du Bois, ao misturar ensaios e antigas canções religiosas, tudo salpicado com tempero autobiográfico, é difícil de ser imitada. Mas inaugurou, ou pelo menos popularizou, uma tradição intelectual antirracista da qual sentimos o eco até hoje. É religiosa no tom, mas segura e lúcida na defesa de valores seculares fundacionais: liberdade e igualdade.

 

'Dead and Alive: Essays'
Zadie Smith, ed.: Penguin Press, £22.17 (352 págs.), £11.99 (ebook)

Smith é mais conhecida por seus romances do que por sua obra de não ficção. Mas, a exemplo de Martin Amis, um de seus heróis literários, é na segunda em que brilha, não na primeira. Suas observações políticas nem sempre são corretas ou precisas, mas certamente são afiadas e animadas por um princípio rígido de honestidade intelectual. Poucas coisas são mais saborosas do que ler o que diz sobre escritoras de gerações anteriores (Didion, Morrison etc.) ou sobre suas cidades amadas: Londres e Nova York.

 

'Para John'
Joan Didion, ed.: HarperCollins, trad.: Marina Vargas, R$ 89,90 (224 págs.), R$ 29,90 (ebook)

O livro é um apanhado das transcrições das sessões de Didion com seu psiquiatra, Roger MacKinnon, durante três anos, e endereçadas ao seu marido, o escritor John Dunne. A obra é meio que o material bruto que culminou em dois de seus livros mais famosos: "O Ano do Pensamento Mágico", de 2005, e "Noites Azuis", de 2011. Em "Para John", assuntos complexos e delicados como luto e alcoolismo são abordados sem um pingo de sentimentalismo, com precisão analítica quase forense.

 

'O Projeto'
David A. Graham, ed.: Zahar, trad.: Berilo Vargas, R$ 79,90 (176 págs.), R$ 39,90 (ebook)

É um excelente mapa da ascensão do trumpismo nos Estados Unidos. Ele disseca o "Projeto 2025", documento elaborado pela Fundação Heritage e outras organizações conservadoras com diretrizes de governo para o redesenho do Poder Executivo. É um livro que demonstra que até um movimento anti-intelectual, como o populismo de direita, necessita de intelectuais e ideias, gostemos delas ou não, para ficar de pé.

 

'Selected Letters of John Updike'
John Updike, org.: James Schiff, ed.: Knopf, U$ 55 (912 págs.), U$ 19,99 (ebook)

Updike escreveu romances, contos, poemas e foi crítico literário da revista The New Yorker. Jogou nas 11. Este livro funciona em pelo menos três níveis distintos: como fonte saborosa de fofocas literárias; como via de acesso ao pensamento vivo do sujeito que inventou nosso imaginário sobre o subúrbio americano; e como romance epistolar experimental, que cobre não só sete décadas do maior cronista dos Estados Unidos, mas do país mesmo, com todas suas enormes contradições.

 

— WALTER PORTO

Editor de Livros e colunista do Painel das Letras

 

'Autobiografia do Algodão'
Cristina Rivera Garza, ed.: Autêntica Contemporânea, trad.: Silvia Massimini Felix, R$ 89,80 (336 págs.), R$ 62,90 (ebook)

Cada vez mais sedimentada como uma das principais escritoras do nosso tempo, a mexicana apareceu até em lista de cotados para o Nobel. E é justo. Se "O Invencível Verão de Liliana" é seu livro que reverbera mais no peito e "Os Mortos Indóceis" é onde ela destrincha sua teoria mais técnica, aqui Rivera Garza produz um equilibro de obra-prima. Tente não se emocionar com a maneira como ela elabora as vidas de familiares mortos; tente não se deslumbrar com a destreza com que usa cada palavra para modular o tom de sua narrativa pessoal.

 

'A Máquina que Pensa'
Stephen Witt, ed.: Intrínseca, trad.: André Fontenelle, R$ 59,90 (272 págs.), R$ 39,90 (ebook)

Se a inteligência artificial é o grande tema do ano, essa é uma bela narrativa de como chegamos até aqui. Disfarçado de biografia de Jensen Huang, empresário taiwanês-americano que fundou a Nvidia, o livro reconta os avanços científicos e as tretas corporativas que possibilitaram o desenvolvimento da IA generativa baseada no treinamento de modelos de linguagem —uma história vertiginosa temperada com brigas de bastidores, vaidades de bilionários e apostas quase ensandecidas.

 

'Mercadores da Dúvida'
Naomi Oreskes e Erik Conway, ed.: Quina, trad.: Fernando Santos, R$ 89,90 (512 págs.)

Que negacionistas existem, nós sabemos. O que Oreskes e Conway revelam nesse livro de 2010, que chega ao Brasil já com status de clássico, é como funcionam as engrenagens lucrativas do negacionismo. Indo do lobby pró-cigarro dos anos 1950 até os influenciadores que rejeitam o aquecimento global hoje, os dois historiadores da ciência mostram, em nível excruciante de detalhe, quem são as pessoas pagas para fazer com que você duvide que a verdade é verdade.

 

'Monstros'
Claire Dederer, ed.: Amarcord, trad.: Joca Reiners Terron, R$ 74,90 (384 págs.), R$ 33,73 (ebook)

A discussão sobre "separar a obra do autor" é quase tão insuportavelmente saturada quanto a do "limite do humor". Por isso é surpreendente o prazer com que se lê essa série de ensaios em que a crítica cultural americana aborda o desconforto —seu, meu, do público— com obras criadas por pessoas horríveis, muito mais por um processo de autoanálise que de julgamento de terceiros. Ao final, é um elogio emocionante à maneira como a arte nos toca em lugares que não conseguimos controlar nem explicar.

 

'Pensar com as Mãos'
Marília Garcia, ed.: WMF Martins Fontes, R$ 64,90 (256 págs.)

Se as máquinas parecem prestes a produzir pensamentos, Garcia lembra que pensar —e escrever— não é nada sem sangue pulsando no peito, sem amor à arte que formou nossas lembranças, sem o risco calculado de se expor em cada página, sem as águas da memória viva agitando o presente.

 

FICÇÃO

 

— ANNA VIRGINIA BALLOUSSIER

Repórter especial da Folha e autora de 'O Púlpito'

 

'A Astrologia de Liv Strömquist'
Liv Strömquist, ed.: Quadrinhos na Cia, R$ 99,90 (184 págs.)

A quadrinista não pretende provar ou refutar crenças esotéricas: quer revelar como a astrologia funciona como espelho do nosso tempo. Com humor ácido e repertório pop-cabeçudo, que vai de Kim Kardashian a Theodor Adorno, ela posiciona o horóscopo no centro de uma conversa sobre identidade, desejo e mercado de atenção.

 

'A Boba da Corte'
Tati Bernardi, ed.: Fósforo, R$ 69,90 (104 págs.), R$ 48,90 (ebook)

Um "plágio", vamos lá, um empréstimo: Tati quebra o barraco, como sintetiza tão bem o título da resenha de Ligia Gonçalves Diniz na revista QuatroCincoUm. A autora escreve um romance de atrito, em que ironia e fragilidade caminham juntas. Ao assumir o ponto de vista da "boba", figura historicamente subestimada, ri da mesma ciranda intelectual paulistana que faz sua vida girar. Ao jogar os tomates no espelho, de boba ela não tem nada.

 

‘O Desabamento'
Édouard Louis, ed.: Todavia, R$ 69,90 (168 págs.), R$ 54,90 (ebook)

Ao narrar a morte do irmão alcoólatra e sua apatia diante dela, o autor desmonta a ideia de tragédia individual para expor um colapso social. Escreve para perdoar e também para ser perdoado. Embora não seja sua melhor obra, ainda é um livraço que o confirma como um dos grandes autores da atualidade, corajoso em dissecar seus dramas familiares na maca sociológica, sem deixar de questionar sua pretensa superioridade moral nesse processo.

 

'Meridiana'
Eliana Alves Cruz, ed.: Companhia das Letras, R$ 69,90 (184 págs.), R$ 34,90 (ebook)

Ao narrar a ascensão econômica de uma família negra, a autora desloca o foco do "chegar lá" para o que se perde no caminho. A troca da favela por um condomínio de classe média não dissolve tensões, apenas as reorganiza. Com múltiplas vozes e atenção a nuances, o romance mostra que mobilidade social, no Brasil, é também um exercício permanente de desenraizamento.

 

'Um Milhão de Ruas: Crônicas 2010-2015'
Fabrício Corsaletti, ed.: 34, R$ 92 (416 págs.)

Craque na poesia, Corsaletti mostra malemolência também neste formato que Rubem Braga resumia como "se não é aguda, é crônica". A prosa desce como uma cerveja geladinha no alto verão, acompanhada de petiscos fotográficos —retratos que ele tirou de ruas que o inspiraram nestas quase 200 crônicas.

 

— LIGIA GONÇALVES DINIZ

Professora da Universidade Federal de Minas Gerais, é autora de 'O Homem Não Existe'

 

'Cantagalo'
Fernanda Teixeira Ribeiro, ed.: Todavia, R$ 89,90 (288 págs.), R$ 63,90 (ebook)

A autora se esquiva de lições fáceis e do ímpeto tão frequente de reescrever o passado neste novelão familiar que atravessa três gerações em uma fazenda mineira no período pós-abolição. A história de Praxedes e suas filhas, cheia de aventuras e twists, revela violências físicas e simbólicas, acordos tortos e estratégias de sobrevivência carregadas de ambivalência. Estreando com segurança, Ribeiro constrói um mundo palpável, por meio de uma dicção própria que nos transporta a um período a um só tempo próximo e distante.

 

'Eleutéria'
Allegra Hyde, ed.: Buzz, trad.: Cássia Zanon, R$ 69,90 (304 págs.), R$ 49,90 (ebook)

A protagonista desse romance de fim de mundo —catástrofe climática, desigualdades, pós-verdade— se define, aos 22 anos, como sábia demais para ser cínica. É uma autodescrição irônica, mas nem tanto, e se aplica ao romance como um todo: "Eleutéria" é a história de uma idealista, de um tipo que nos acostumamos a desprezar como ingênuo, mas que se apresenta com um frescor muito bem-vindo. Basta de distopia, e Hyde mostra, em um romance bonito e bem amarrado, que a esperança pode soar inteligente e que vale a pena imaginar mundos alternativos.

 

'O Imperador da Felicidade'
Ocean Vuong, ed.: Rocco, trad.: Rogério W. Galindo, R$ 79,90 (400 págs.)

"Alegria" seria uma tradução melhor para "Gladness", nome da cidade da Nova Inglaterra em que vivem o protagonista Hai e seus amigos e familiares. A alegria é mais frágil, mais contingente, mas também mais comovente e extraordinária, e assim são as possibilidades desses personagens, que vão vivendo com salário mínimo, vício em opioides ou mesmo demência, como é o caso da adorável Grazina, a idosa lituana sob cuidados de Hai. Parece deprê e até cafona, e o romance é ambas as coisas, mas esse é um preço baixinho a se pagar quando ele nos entrega tanta beleza —e também um bocado de risadas.

 

'O Polonês'
J.M. Coetzee, ed.: Companhia das Letras, trad.: José Rubens Siqueira, R$ 79,90 (144 págs.), R$ 39,90 (ebook)

A perspectiva e a experiência da decadência, as contradições do desejo e a precariedade da tradução —entre línguas, entre sujeitos— são temas de Coetzee que aparecem aqui em dose concentrada. Um velho pianista em fim de carreira encontra uma mulher de 40 e poucos anos em uma vida confortável e insípida; e o Nobel sul-africano já tem o suficiente para conceber uma pequena obra-prima a respeito das frágeis possibilidades de encontrarmos o outro e de como é quase inevitável apostarmos nelas.

 

'Só um Pouco Aqui'
María Ospina Pizano, ed.: Instante, trad.: Silvia Massimini Felix, R$ 74,90 (176 págs.)

A escritora colombiana faz um elogio da atenção neste romance singular acerca dos movimentos que bichos, humanos ou não, se veem forçados a fazer nas Américas do presente. Uma narração em terceira pessoa nos faz trotar por ruas e estradas, cavar buracos na terra e nos equilibrar no ar, ao tentar imaginar —sem impor certezas— o que pensam ou sentem duas cadelas, um porco-espinho bebê, um passarinho e um besouro. O resultado é uma viagem sem um pingo de cinismo, carregada de uma ternura de que estamos todos precisando.

 

— LUIZ MAURÍCIO AZEVEDO

Pesquisador na Unicamp, é autor de "Estética e Raça: Ensaios sobre a Literatura Negra"

 

'Jacarandá'
Gaël Faye, ed.: 34, trad.: Mirella Botaro e Raquel Camargo, R$ 72 (240 págs.)

Em um ano em que a diplomacia não foi capaz de interromper as guerras que a tirania construiu, "Jacarandá" nos ajudou a compreender os muitos e doloridos significados da palavra genocídio.

 

'Mar de Palavras'
Jandeilsom, ed.: Urutau, R$ 49,90 (80 págs.)

Muito se fala sobre uma suposta supremacia do tema em detrimento dos méritos estéticos na produção contemporânea. Em "Mar de Palavras", o autor prova que é possível pensar no "como" sem se descuidar do "quê". Por isso, Jandeilsom é a maior revelação literária do ano.

 

 

'James'
Percival Everett, ed.: Todavia, trad.: André Czarnobai, R$ 89,90 (320 págs.), R$ 64,90 (ebook)

O modo como Everett fabrica seu mundo ficcional, tragando o espírito do tempo e o transformando em uma tradição literária infinitamente renovada, coloca-o como nome incontornável da literatura nas próximas décadas.

 

'A Contagem dos Sonhos'
Chimamanda Ngozi Adichie, ed.: Companhia das Letras, trad.: Julia Romeu, R$ 89,90 (424 págs.), R$ 39,90 (ebook)

O retorno de Adichie à narrativa longa mostra que há batalhas que só podem ser travadas quando aceitamos a natureza provocativa da longa trilha dos empreendimentos criativos. Trata-se de um magistral romance, escrito por uma autora que fez da politonia narrativa sua religião.

 

'Lulli, a Gata Aventureira'
Míriam Leitão, ed.: Rocco, R$ 69,90 (40 págs.), R$ 34,90 (ebook)

Uma comovente história sobre os poderes da linguagem e da empatia. Enfrentando um tema difícil, Leitão nos presenteia com uma economia simbólica de afetos que não se desmancham no ar.

 

— WALTER PORTO

Editor de Livros e colunista do Painel das Letras

 

'Corsária'
Marilene Felinto, ed.: Fósforo e Ubu, R$ 79,90 (176 págs.), R$ 55,90 (ebook)

Quem dera mais gente escrevesse tão bem quanto Marilene Felinto, dona de literatura intensa e exuberante, dura e beligerante. Seus livros têm o impacto de uma porrada bem dada na orelha e a dor de escoriações que demoram meses, anos, uma eternidade toda para sarar.

 

'Horas Azuis'
Bruna Dantas Lobato, ed.: Companhia das Letras, R$ 79,90 (144 págs.), R$ 39,90 (ebook)

Em seu romance de estreia carregado de voz da experiência, Bruna Dantas Lobato é capaz de invocar os sentimentos mais ancestrais —a ligação umbilical com a mãe que está distante, a saudade desesperada de um tempo que escorre— de forma absolutamente afinada à sensibilidade de um mundo digital.

 

'Mártir!'
Kaveh Akbar, ed.: Rocco, trad.: Layla Gabriel de Oliveira, R$ 84,90 (384 págs.), R$ 42,90 (ebook)

Akbar mete o pé na porta com a história de Cyrus Shams, um jovem iraniano alcoólatra que fica obcecado em dar sentido à própria morte quando percebe que a de seus pais não teve nenhum. É uma discussão fascinante desmembrada num enredo surpreendente, com um dos protagonistas mais inesquecíveis da literatura contemporânea.

 

'Nossa Vingança É o Amor'
Cristina Peri Rossi, ed.: 34, trad.: Ayelén Medail e Cide Piquet, R$ 98 (400 págs.)

Talvez a maior poeta de sua geração na literatura latino-americana, a uruguaia precisou ficar octogenária até ver uma grande antologia de seus textos editada no seu país vizinho. A forte repercussão da obra, com 50 anos de poemas de paixão insubmissa e voracidade libertária, já demonstra o quanto havia de demanda reprimida.

 

'Orbital'
Samantha Harvey, ed.: DBA, trad.: Adriano Scandolara, R$ 79,90 (192 págs.), R$ 55,90 (ebook)

"O planeta Terra é azul, e não há nada que eu possa fazer", cantou David Bowie sobre uma pessoa sentada dentro de uma lata no espaço —assim como os protagonistas deste romance arrebatador em sua delicadeza. Astronautas flutuam dentro de uma nave espacial, impotentes em toda a sua humanidade, por quase 200 páginas. Mas, consumada a leitura, as estrelas vão parecer muito diferentes hoje.

 

Fonte: Folha de S. Paulo em 16/12/2025