O MAIS LOUCO DOS PINTORES DA HUMANIDADE
30 ANOS DA MORTE DE SALVADOR DALÍ
Mas também pode ser considerado genial, excêntrico, espetacular. O catalão teve uma carreira brilhante.
Salvador Dalí foi o mais louco, insólito e indomável dos grandes pintores da humanidade. Era genial, espantoso e maniático. Quem visita o seu museu na cidade de Figueres, na Costa Brava espanhola, ou vai a uma das suas casas na beira do Mediterrâneo, pode constatar isso, se divertir e admirar as suas manias. Na casa-museu à beira da praia em Cadaqués, há bugigangas que o pintor recolheu em suas andanças pelo mundo, principalmente nos Estados Unidos, onde morou. Ali, dizem os nativos, Dalí desenvolveu a essência da sua arte e se tornou um amante da extravagância. Nascido em 11 de maio de 2904 em Figueres e morto em 23 de janeiro de 1989, Dalí e o seu bigodão artístico e sinuoso, a sua cara de doido e o seu prazer em provocar escândalos comportamentais, está sendo lembrado este ano com mais insistência em várias exposições pelo mundo, especialmente na sua região, a Costa Brava, na Catalunha. Os 30 anos da sua morte precisam ser lembrados com estardalhaço, pois ele foi um artista único, especial e mirabolante.
Um dos grandes representantes da estética surrealista, ou talvez seu único expoente expressivo, Salvador Domingo Dalí Domènech achou que o lugar onde nasceu era pequeno demais para sua capacidade mental de pensar e criar. Então, em 1922, mudou-se para Madri e foi morar na Residência dos Estudantes, onde ficou amigo do poeta Federico Garcia Lorca e do futuro cineasta Luís Bunuel. Ingressou logo na Academia de Belas Artes de San Fernando. Já era olhado como gênio. Personalidade excêntrica, com cabelos longos, gravata desproporcionalmente grande e uma capa que ia até os pés, nessa época realizava pinturas que passavam do realismo para composições cubistas como o “Autorretrato com L’Humanité” (1923).
GRANDEZA
Em 1925, realizou sua primeira mostra individual na Galeria Dalmau, em Barcelona. Em 1926, foi expulso da Academia de Artes por se desentender com um professor e declarar que ninguém tinha capacidade para avaliá-lo. A sua mania de grandeza era tanta que achava todo mundo que o cercava imbecil demais para a sua aceleração criativa. Foi embora para Paris, onde, dizem, ele achou alguém à sua altura: Pablo Picasso. Em 1927, se instalou em Paris e tornou-se membro oficial do movimento Surrealista, liderado pelo poeta André Breton, que surgiu como reação ao racionalismo e ao materialismo da sociedade ocidental. Usar o potencial do subconsciente momo fonte de imagens fantásticas e de sonhos era o objetivo do grupo. Em 1929 voltou à Espanha e continuou criando como nunca. “Ele tinha uma capacidade de se reinventar que impressionava a todos. Trabalhava até 20 horas por dia”, diz uma entusiasmada guia que vai explicando cada quadro exposto no museu de Figueres a um grupo de turistas curiosos.
A radicalidade na vida pessoal de Dalí começou em Paris em 1929, quando realizou a sua primeira mostra individual e ganhou o status de pintor surrealista. No plano pessoal, também houve uma metamorfose brutal.
Conheceu a russa chamada Gala (Helena Ivanovna Diakonova), que deixou o marido, o poeta Paul Éluard, para seguir aquela figura excêntrica. Ela se tornou modelo, conselheira e companheira para o resto de sua vida. Em 1930, mudou-se com Gala para o Sul da França e depois para Cadaqués, na Espanha, onde comprou uma casa. Em 1931, realizou a segunda mostra individual na Galeria Pierre Colle, em Paris. Na mostra, entre outras obras, Dalí apresenta a tela “Persistência da Memória”. A obra, adquirida por um colecionador particular, em 1934, foi doada posteriormente ao Museu de Arte Moderna de Nova Iorque.
Na década de 30, a maturidade artística de Dalí explodiu. Foi a época em que ele produziu o melhor de sua obra: telas nas quais pessoas, animais, objetos e paisagens se fundem em composições chocantes. Sua pitura desconexa está bem representada na tela “Composição Surrealista com Figuras Invisíveis” (1936), onde no centro de uma paisagem desolada, uma cama e uma poltrona surgem vazias, mas conservam os contornos dos corpos ausentes.
Dalí se valia daquilo que chamou de “Método Paranoico-Crítico” na tentativa de representar o fluxo do inconsciente e dos sonhos. Suas estranhas imagens de sonhos foram retratadas tão nítida e realisticamente quanto possível em um modo de pintura que se assemelhava à fotografia em cores.
Dalí era amplo e não perdia oportunidades para se engajar na coisas do seu tempo. Visitou Sigmund Freud, o pai da psicanálise, em 1938, em Londres onde vivia como um ‘foragido’ do nazismo. Ele mostrou ao austríaco o quadro “Metamorfose de Narciso” para ver o que Freud achava. A polêmica sempre estava em volta dele, como insistia em afirmar. Em 1939, o escritor André Breton o expulsou do grupo surrealista por considerá-lo reacionário e criou um anagrama com o nome do artista para denunciar seu apetite por dinheiro: “Avida Dollars”. Os surrealistas eram partidários das teorias marxistas, das quais Dalí não gostava. Com o início da Segunda Guerra, o pintor foi para os Estados Unidos junto de Gala. Permaneceram oito anos até a calma voltar à Europa.
MUDANÇAS
A metamorfose de Dalí é constante. Na Espanha, a partir de 1948, ele se autoproclama um pintor católico e até apresenta a obra “A Madona de Port Lligat”, ao papa Pio XII. Nos anos 50, Dalí apresenta a segunda versão da “Madona de Port Lligat” com mais de 3 metros de altura, que o próprio autor a considera como sua obra-prima máxima. Outras obras de cunho religioso se sucedem como a “Cabeça Rafaelesca Arrebentada” (1951), que tem a mesma estrutura da cúpula do Pantheon, “Crucificação” (1954) e “A Última Ceia”.
A guia do museu de Figueres fala com rapidez e clareza sobre Dalí. Parece tudo decorado, mas não é. Para quem tem dúvidas e faz perguntas ela responde, interpreta e revela todo o seu carinho pelo pintor. Diz, por exemplo, que a obra pictórica de Dalí chama a atenção pela ímpar combinação de imagens bizarras, como nos sonhos, com uma técnica acadêmica, tradicional, similar à dos artistas da renascença. Além de seu trabalho na pintura, poucos conhecem a sua enorme versatilidade. Ele incursionou pela escultura e deu importantes contribuições ao teatro , moda, fotografia, cinema (trabalhou com o mestre do suspense, Alfred Hitchcock), comerciais de televisão e até na arte do design, criando logotipos, quem diria? Para produtos comerciais.
Com vasta obra e uma bem nutrida genialidade, Dalí, porém, deixou para a história coisas obscuras, para desencanto de seus contemporâneos e de gerações futuras. A simpatia pelo regime fascista do generalíssimo Franco e pela monarquia, duas coisas que não combinavam com o mundo da cultura e das artes daquela época e de tantas outras, deixaram marcas profundas na sua biografia. Mas ele se dizia também um anarquista, o que não dá para negar ao se analisar a sua obra.
UM MUSEU IMPERDÍVEL EM FIGUERES
O Teatro-Museu Dalí é programa imperdível e bem legal para quem vai à Costa Brava. Localizado em Figueres, Catalunha, foi inaugurado em 1974. O museu era um antigo teatro da cidade de Dalí quando ele era criança, e onde suas primeiras exibições públicas foram realizadas. O antigo teatro foi bombardeado na Guerra Civil Espanhola – 1936-39 – e permaneceu em estado de ruína por décadas até Dalí e o prefeito de Figueres decidirem reconstruí-lo, em 1960.
O museu foi aberto em 1974 e continuou em expansão até 1980. Abriga a maior e mais diversificada coleção de obras de Salvador Dalí, incluindo esculturas, colagens, mobiliário e outras curiosidades produzidas pelo pintor. O local abriga também uma pequena seleção de obras de outros artistas escolhidos por Dalí, e uma galeria dedicada ao trabalho de um amigo, o artista catalão Antoni Pitxot, que se tornou diretor do museu. Uma área do museu se torou também o local do seu túmulo.
Uma peculiaridade de sua obra era a admiração por certos quadros, que ele cita indefinidas vezes em seu trabalho. Entre essas pinturas estão “A Última Ceia”, de Leonardo da Vinci; “As Meninas”, de Velázquez; “Angelus”, de Millet; “A Batalha de Tetuan”, de Meissonier e “A Rendeira”, de Vermeer de Delft (seu pintor favorito). Elas aparecem pintadas nos quadros de Dalí em diversas formas, sob diversas condições, como sombras, desmembradas, analisadas em diversas dimensões, em sombras, relevos, etc.
Dalí morreu de pneumonia e falha cardíaca na cidade onde nasceu e foi sepultado no átrio principal de seu teatro-museu. Suas últimas obras datam de 1983.
Em 1982, durante a Copa do Mudo da Espanha, ele fez algumas parições em Barcelona. Chegou a dar entrevistas e, com sua ironia e doboche, lançou farpas contra o futebol, mas pouca gente lhe deu ouvidos.
PRINCIPAIS OBRAS DE SALVADOR DALI
1922 – Cabaret Scene e Night Walking Dreams
1925 – Large Harlequim and Small Bottle of Rum
1926 – Basket of Bread e Girl from Figueres
1927 – Composition With Three Figures e Than Blood
1929 – O Grande Masturbador
1929 – Os primeiros Dias da Primavera
1931 – A Persistência da Memória
1931 – A Velhice de Guilherme Tell
1932 – O Espectro do Sex Appeal
1932 – O Nascimento dos Desejos Líquidos
1932 – Pão-antropomorfo Catalão
1933 – Gala Com Duas Costeletas de Carneiro em Equilíbrio Sobre o Seu Ombro
1936 – Canibalismo de Outono
1936 – Construção Mole com Feijões Cozidos
1937 – Metamorfose de Narciso
1937 – Girafa em Chamas
1938 – España 1938
1940 – A Face da Guerra
1943 – Poesia das Américas
1944 – Galarina e Sonho Causado Pelo Voo de uma Abelha ao Redor de Uma Romã um Segundo Antes de Acordar
1945 – A Cesta do Pão
1946 – A Tentação de Santo Antônio
1949 – Leda Atômica
1949 – Madona de Portiligat
1951 – Cristo de São João da Cruz
1954 – Crucificação (“Corpus Hypercubus”)
1956 – Natureza-Morta Viva
1958 – Rosa Meditativa
1959 – A Descoberta da América por Cristóvão Colombo
1970 – Toureiro Alucinógeno
1972 – La Toile Daligram
1976 – Gala Contemplando o Março1983 – The Swallow’s Tail
Fonte: Correio do Povo/CS/Eugenio Bortolon em 16/03/2019
Saiba mais sobre as obras de Salvador Dalí: http://cultura.culturamix.com/arte/obras-do-salvador-dali