NA ESTRADA COM O SEPULTURA
Documentário conta a história da banda mineira que se tornou um dos gigantes do heavy metal.
Documentário: SEPULTURA ENDURANCE, de Otávio Juliano, 2016, 104 min.
O aviso nos créditos finais do documentário SEPULTURA ENDURANCE é reiterativo para os fãs da banda mineira que colocou o Brasil no mapa da divisão peso pesado da música internacional: “Max e Iggor Cavalera se recusaram a participar deste filme”. E não apenas se recusaram, mas também restringiram o uso de músicas com suas participações. O que se vê e ouve dos Cavalera na produção que entra em cartaz hoje (15/06) no espaço Itaú segue diretrizes legais referentes a direitos autorais e de uso de imagem.
- Max e Iggor foram convidados. Respeito a posição deles. Quanto às músicas, lamento essa atitude – diz Otávio Juliano, diretor do documentário, em entrevista a ZH, destacando que seu filme não foi prejudicado pela decisão dos músicos. - Não mudei nada do roteiro final. Tive que cortar a duração das músicas, que são executadas pela formação atual.
Otávio acompanhou o Sepultura ao longo de seis anos, em três turnês mundiais e gravações de discos, como o mais recente, MACHINE MESSIAH (2017), lançado em janeiro. Um show com a atual formação da banda – Derrick Green (vocal), Andreas Kisser (guitarra), Paulo Xisto Jr. (baixo) e Eloy Casagrande (bateria) – forma o eixo da narrativa, que passa em revista, com depoimentos e imagens de arquivo, os mais de 30 anos da fulgurante carreira do grupo criado em 1984, em Belo Horizonte, pelos adolescentes Max (guitarra), Iggor (bateria), Paulo Xisto jr. (baixo) e Wagner Lamounier (vocal). Após algumas mudanças de configuração, a formação que se tornaria “a clássica” se consolidou em 1987, com a entrada de Kisser, com Max assumindo os vocais. A ascensão do Sepultura no subgênero do chamado thrash metal – que tinha expoentes como Metallica e Slayer – foi estrondosa. Seu terceiro disco, BENEATH THE REMAINS (1989) teve lançamento pelo selo americano Roadrunner. O sucesso mundial foi consolidado com ARISE (1991), CHAOS A.D. (1993) e ROOTS (1996).
Entrevistados como Lars Ulrich, do Metallica, Phil Campbell, do Motorhead, e Scott Ian, do Anthrax, destacam no filme o impacto provocado pela sonoridade original que o Sepultura apresentou combinando no peso elementos da música brasileira.
Mas o estresse da vida na estrada, a fama e o dinheiro, segundo conta Kisser no documentário, começara a minar a “brodagem” que marcava a convivência da banda. Segundo o guitarrista, a empresária deles, casada com Max, procurava colocá-lo à frente dos companheiros, tanto na autoria das músicas quanto nas exigências de camarins e ônibus separados. Max acabou deixando a banda em 1997. Iggor seguiu até 2006, e sua saída também acentuou o desgaste nas relações internas.
SEPULTURA ENDURANCE destaca, portanto, a história pelo ponto de vista de Kisser e Paulo Xisto Jr., que revisitam locais e pessoas associados aos primeiros passos da banda em Belo Horizonte, falam sobre os sacrifícios que a vida na estrada impôs nas relações familiares, as crises com os Cavalera e a renovação trazida pelo vocalista americano Derrick Green, cuja entrada enfrentou resistência da gravadora e de produtores.
Sem dúvida, Max e Iggor teriam muito a acrescentar com suas versões dos fatos – os depoimentos presentes acabam sendo reiterativos e, por vezes, um tanto laudatórios. Mas a garimpagem que Otávio Juliano faz de mais de 800 horas de material gravado e de 3 mil itens do arquivo pessoal de Kisser é valiosa:
- Eu não tinha nenhuma relação com o Sepultura antes do filme. Procuramos a banda quando eu tinha acabado A ÁRVORE DA MÚSICA (2010) premiado documentário em longa. Mostrei o filme, eles gostaram e começamos a produção, encerrada depois da gravação do show de 30 anos (em 2016). E ainda gravamos o Lars, do Metallica, em 2017.
O diretor afirma que teve atuação “neutra” e que o grupo não teve ingerência na produção:
- Assistiram ao filme pela primeira vez quase terminado. A banda foi generosa e corajosa, abriu as portas. Foi uma experiência gratificante. Ter uma câmera por perto todo esse tempo não é fácil, tanto no estúdio quanto na estrada. Eu tinha um objetivo: um documentário que englobasse o processo criativo, a vida nas extensas turnês, material de arquivo, grandes nomes do metal e material inédito. Queria passar a sensação de estar ali para o público, que as pessoas se sentissem próximas.
Fonte: ZeroHora/2º Caderno/Marcelo Perrone (marcelo.perrone@zerohora.com.br) em 15/06/2017.