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Entrevista com Susan Pinker
Entrevista com Susan Pinker

ENTREVISTA COM SUSAN PINKER

 

Paradoxos da natureza e da cultura.

 

Convidada do ciclo de palestras Fronteiras do Pensamento, a psicóloga canadense Susan Pinker, 60 anos, provoca polêmica a cada publicação. Colunista de comportamento humano no Wall Street Journal, ela já colaborou com jornais do porte do New York Times. Em 2008, lançou O PARADOXO SEXUAL, livro no qual sustenta que existem diferenças de gênero de natureza biológica. Provocou furor entre feministas. Em 2014, publicou THE VILLAGE EFFECT, um estudo sobre a longevidade de habitantes da sardenha cuja justificativa estaria mais no tipo de relação pessoal cotidiana, face a face, do que em aspectos naturais. Nesta entrevista para O Caderno de Sábado ela defende suas ideias.

 

 

O psicanalista norte-americano Aaron Balick afirma que as redes sociais eliminam as noções de empatia e vergonha. A senhora, que valoriza as relações face a face, concorda com isso?

Concordo, pois na comunicação digital nem sempre temos a possibilidade de ver a reação do outro. Posso dizer o que bem entender sem temer. Na relação face a face, se digo qualquer coisa, por exemplo, um insulto, a reação é imediata. Há um efeito sobre mim. Na internet, é anônimo. Eu não diria que elimina a empatia e a vergonha. Isso me parece exagerado. Mas certamente reduz. Somos animais sociais como os macacos e evoluímos como seres humanos na vida em grupo. Tudo que diz respeito ao nosso cérebro, inclusive nossa capacidade de pensar, evoluiu em situações de contato. Olhar nos olhos do outro ajuda a constatar se há confiança. Sem isso não há vínculo.

 

 

No livro O PARADOXO SEXUAL a senhora sustentou que existem diferenças inatas entre homens e mulheres que afetam comportamentos.

Claro. O comportamento está ligado à atividade cerebral, que é afetada por hormônios. Tudo tem um aspecto biológico. Nem todas as diferenças entre homens e mulheres são explicadas biologicamente, mas existem aspectos que dependem disso como demonstra a ciência. Desconsiderar isso faz com que não se compreenda coisa alguma.

 

 

Dê um exemplo de influência biológica ao comportamento feminino.

As mulheres, na sua evolução ao longo dos milênios, aprenderam a interpretar o comportamento e as emoções dos bebês. Sobrevivemos graças a mães que compreenderam nossas necessidades quando ainda não podíamos falar. É como se uma rede de hormônios facilitasse a interpretação e a ação. Nem todo homem é incompetente nisso obviamente, mas as mulheres, com certeza levam vantagem.

 

 

A ideia, portanto, de que as diferenças de comportamento entre homens e mulheres são construídas socialmente é um erro?

Não. Não é erro. Acontece que nos últimos anos compreendemos que isso não dá conta de tudo. Explica apenas uma pequena parte. Nos Estados Unidos, as portas das universidades e do mercado foram abertas às mulheres. Há agora mais mulheres do que homens no mundo acadêmico. Há cada vez mais advogadas, médicas, veterinárias. Não se trata mais de discriminação. Existem, no entanto, campos pelos quais as mulheres não estão interessadas pela falta de um lado mais humano.

 

 

A senhora defendeu Larry Summers, que era presidente da Universidade de Harvard, quando ele explicou o menor número de mulheres na ciência como falta de aptidão.

Não foi isso que ele disse. Ele falou que há diferenças mais intensas nas extremidades da curva. Há de um lado mais homens entre os ganhadores da medalha Fields de matemática e de outro lado também mais homens entre os idiotas completos. As mulheres ficam no meio. Constata-se que quando a gente se aproxima dos extremos há menos mulheres. Também há mais homens entre os que aceitam correr riscos.

 

 

A senhora provocou polêmica também ao dizer que os homens ganham mais por priorizarem o trabalho. Essa é a explicação válida?

Não existem diferenças em preto e branco entre homens e mulheres. Numa distribuição normal há mais homens com interesses focados estreita e profundamente. Há mais mulheres com interesses mais amplos. Nada é apenas cultural ou biológico. Há sempre um pouco de cada um desses aspectos. Se um homem trabalha 70 horas por semana não é pelo fato de que os homens se interessam mais por trabalho, mas que eles priorizam isso às relações humanas. O aspecto biológico disso tem a ver com o fato de que homens se concentram mais em coisas mais específicas e são mais competitivos com outros homens enquanto as mulheres competem consigo mesmas. É outra noção de competição.

 

 

Há muita discussão atualmente em torno da noção de ideologia de gênero. Judith Butler foi muito atacada no Brasil. O que pensa disso?

Não quero fazer um comentário sobre Judith Butler. A ideologia ocupa mais espaço do que a ciência nessa situação. Não vamos avançar socialmente submetendo fatos científicos a ideologias. Há medo da ciência. O mesmo acontece entre os que temem a ciência em relação ao aquecimento global. Há quem prefira não ver. O mesmo se dá em relação aos desejos das mulheres. Existem estudos científicos sérios sobre isso. E ideólogos que preferem não ver. A maioria das mulheres escolarizadas prefere trabalhar meio turno quando têm filhos pequenos e até quando eles crescem. Não interessa saber de onde vem essa inclinação, mas sim constatar que é verdade e adotar medidas. Ignorar isso fará com que muitas mulheres percam oportunidades por não terem sido feitas para esse calvário. Se pedirmos a mulheres com três filhos que viagem ou cumpram 70 horas de trabalho semanal muitas pedirão demissão. Três quartos das mulheres querem conciliar as coisas.

 

 

Ideias assim a colocam em confronto com feministas?

Meu primeiro livro provocou muitas polêmicas com feministas. O atual, não. Há mulheres que não aceitam mudar de posição.

 

 

Como reage quando a chamam de conservadora?

Não aceito. Faço ciência. Fui chamada de conservadora por meu primeiro livro, Pelo atual, sou chamada de progressista. O que sou?

 

 

No seu livro mais atual, sobre a longevidade de habitantes da Sardenha, o aspecto cultural, o modo de vida, com relações face a face permanentes, parece predominar sobre o biológico e o alimentar?

Não. Os dois livros têm o mesmo ponto de vista. No primeiro livro, mostrei que mulheres são obrigadas a se comportar como homens em busca de aceitação e sucesso. Meu argumento é que para as mulheres o critério de êxito é outro. Quem nos obriga a ser famosos? Isso é uma ideologia conservadora. Agora, mais uma vez, faço uma constatação que combina cultura e biologia. A longevidade na Sardenha é explicada em apenas 25% pelos genes. Os outros 75% não dependem disso. Temos de considerar também que as relações sociais também são biológicas.

 

 

A senhora diz que se habitantes da Sardenha vivem cem anos não é só por causa da dieta que praticam, mas também de como se relacionam.

Os hormônios afetam nossas emoções. Tudo se relaciona. As sociedades se constroem de diferentes maneiras. Em algumas, a relação humana é mais valorizada. Há um efeito gradual. Quase sempre são as mulheres que cuidam dos idosos. Para mim não se pode separar cultura e natureza. Elas estão sempre misturadas. Dividir mascara a realidade.

 

 

A internet é perigosa por diminuir a relação face a face?

Falar em perigo é um exagero. Contudo há uma substituição da relação face a face. O trabalho e o lazer se dão cada vez mais no virtual. Apesar dos muitos pontos positivos na tecnologia. Ter um carro é muio bom. O aspecto negativo está na poluição. O importante é ter consciência dos ganhos e perdas e buscar o equilíbrio.

 

 

A senhora vê suas posições como científicas e as dos outros como ideológicas. O mesmo não se dá com os que pesam diferente?

Há pessoas que ignoram a ciência.

 

 

Os Estudos Culturais se veem como científicos?

Os Estudos Culturais não são ciência. O método científico é o mesmo por toda a parte e para todos. Há etapas a cumprir. Nos Estudos Culturais se discute e se faz interpretações, mas não ciência.

  

Fonte: Correio do povo/CS/Juremir Machado da Silva em 09//12/2018